sexta-feira, 18 de abril de 2008


UM GAFANHOTO ENORME


A porta foi aberta. Havia, ainda, um vão imenso lá atrás daquela cortina, do pano branco. Solitário, em cima do banco, o pequeno aparelho disparava uma luz de cor diferente cada vez que alguém, do outro lado do pano, se mexia. Era como um tiro, transformando tudo numa cor só, mas, aqui de trás do pano, no breu, víamos apenas um raio e um clarão.

Tudo começa a rodar fazendo com o rastro um desenho estranho e bonito, circular, solto. A pequena fumaça, que na verdade eram só partículas do ar que movíamos ao rodopiar, apagava bem rápido, antes que pudéssemos entender bem que desenho era, mas, se nos projetássemos pra fora de tudo, distantes, poderíamos imaginar, dentro de nossas cabeças, o desenho real.

De fora, e vendo dentro de todos, eu percebi as cores diferentes e os desenhos diferentes que cada um imaginava. Mas não seria óbvio que fosse assim? De qualquer forma, enchi o peito de alegria e abri um sorriso. Percebi, no reflexo das cores, meus olhos brilhando e no reflexo do brilho dos meus próprios olhos, todas as cores. Nunca saíram daqui. Não eram tiros, eram só clarões, não importa de onde se olhasse.

Um dos clarões veio tão forte que ouvi uma música tocar. Um zunido, e, de repente um gafanhoto enorme rodopiava, dançando ao som do próprio canto, no ritmo das cores que explodiam nos clarões descompassados. De repente me encontro em pé. Tudo parado. As cores se esconderam em algum lugar. No início tudo parece desbotado, inerte, só percebo o contorno, mas, lentamente, a música vem voltando e as cores começam a se manifestar. Algo que eu nunca vi antes. Elas só parecem refletidas, mas eu não consigo perceber de onde.

Me deparo com uma parede enorme. Não vejo o topo, não vejo os limites, só vejo onde corta onde piso, e, ainda assim, não me atrevo a chamar de chão uma placa flutuante. À medida que a música vai ficando mais intensa, o desenho vai se definindo. Na parede nasce um jardim. As raízes vão crescendo, desenhando rodopios, desenhando o ritmo disso tudo, seja lá o que for. Preciso de um nome, pelo menos pras cores. As folhas de verde intenso brilham, refletidas de algum lugar que não sei qual é. Espelhos verdes com pequenos detalhes lilases. Fico em pé ainda algum tempo, contemplando aquilo tudo. Daqui não me projeto pra fora. Não sei de onde vem a luz. Não sei a cor real dos espelhos. Não entendo mais o ritmo. Não vejo mais de longe, não vejo mais por dentro. Fico em pé, olhando, estarrecidamente, a parede. Preciso, novamente, me mexer.